domingo, 22 de setembro de 2013

Vem cá, te conheço?



Vem cá, te conheço?
Há certo tipo de encantamento maligno na convivência.  Talvez a pessoa x pudesse ter um ótimo papo sobre a transcendência dos elementos estéticos de um texto. Mas vocês acabam conversando paradoxalmente sobre qualquer coisa inútil, como falar mal de alguém. Talvez a pessoa y seja apenas um babaca. Mas a convivência coloca-o no mesmo círculo de x. Às vezes, a pessoa z poderia ser seu melhor amigo. Mas a pessoa z não está no seu círculo de convivência.
            E você sai da sua casa, do seu trabalho, da sua aula e tem coragem de parar sozinha naquele café. Aquele café bonito que tem toda uma atmosfera de filme. Que te dá vontade de recitar poemas ou fumar, mesmo você não fumando. Naquele café, há mais quatro ou cinco pessoas como você. Que poderiam estar na sua mesa. Que poderiam ser seus amigos de longa data. Mas você está preso ao seu circulo de convivência e o mais longe que chega é uma sugestão de amigo do facebook.
            E se, naquele dia, você decidisse sentar na mesa daquela estranha que usa roupas que você acha legais. Que está lendo um livro do Tchekhov que você já leu e queria discutir com alguém. E ela pediu um café que você sabe que não é o melhor, poderia indicar um outro. Mas acaba que as convenções sociais te fazem ficar na sua mesa. Ela ficar na dela. Imagina, uma menina ir puxar papo com outra menina. Onde foi parar sua heterossexualidade? Mas, talvez, você só estivesse atrás de uma conversa para fugir do encantamento maligno da convivência.

            Pago a conta e vou embora. Nem experimentei as empadas Caruso. Nem soube que aquela pessoa poderia querer desabafar. Pego o ônibus. Vou embora. Entro no facebook e começo uma conversa “você não sabe da última!”...


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